A NOSSA ESPERANÇA
Nos encaminhamos para a conclusão do Ano Jubilar. Na nossa peregrinação espiritual, acompanha-nos o lema “A Esperança não decepciona". Qual é a nossa Esperança?
C. Lorenzo Rossetti
Mestre em História e Filosofia (Bruxelas e Lovania, Bélgica) e Doutor em Teologia (Gregoriana, Roma)

Ascensão de Cristo, “âncora” da nossa Esperança
(Cf. Hb 6).
Afresco pintado por Kiko Argüello na abside da Catedral de La Almudena (Madri).
1. EXISTE ALGO DEPOIS DA MORTE?
Sim! Jesus Cristo, nos ensinou que Deus é Amor e viveu sempre na santidade. Ele morreu por todos nós com um amor infinito. Este Jesus não ficou no túmulo: ressuscitou; Ele venceu o pecado e a morte! Agora Cristo está glorioso no Céu, intercede por nós e quer dar-nos o seu Espírito. O Espírito Santo é o próprio Deus em nós, o amor que vence o mal, o medo, o ressentimento; uma Força que nos dá a garantia da Vida eterna, nos enche de alegria e cria verdadeira comunhão.
A nossa Esperança, nascida da certeza de que o Amor vence a morte, faz-nos desejar a plenitude desta Vitória e impele-nos a invocar o encontro com o Salvador: “Ven Senhor Jesus!” (Ap 22,17). E preparamo-nos para isso através de uma vida de justiça e de amor aqui na terra (cf. 2Pd 3,11ss).
2. O QUE É A MORTE PARA UM CRISTÃO?
Aparentemente, a morte é o fim inevitável da vida. Na realidade, é apenas o fim desta existência terrena que é o tempo de preparação para a verdadeira Vida, a Eternidade de Deus que é Espírito (Jo 4,24), Luz e Amor (1Jo 1,5; 4,8). Para um cristão, a morte é como o dia do nascimento (dies natalis) após a gravidez; é chegar a uma situação preferível a esta vida porque “o viver é Cristo e o morrer é lucro” (Fl 1,21); deixar o corpo mortal para “adormecer no Senhor” (At 7,60) para estar com Ele (2 Cor 5,8), para sempre (cf. 1Tes 4,17). Inspirado pelo Espírito Santo, que é a “garantia da nossa herança” (Ef 1,13s), o cristão, em vez de ter medo da morte, vê-a como uma Passagem abençoada (uma “Páscoa”). A morte não deve ser súbita (cf. Lc 13,3ss), mas preparada por uma vida de amor e concluído com os três sacramentos finais (Confissão, Unção, Comunhão) e a entrega ao padroeiro da boa morte, S. José, que morreu consolado por Jesus e Maria.
3. O QUE É O PARAÍSO?
Imediatamente após a morte, pode-se desfrutar da comunhão com Deus. A Vida eterna é comunhão perfeita e íntima com Deus Pai em Cristo (cf. Jo 17,3), imersão infinita no amor divino; alegria abismal pela plenitude da vida. Ouviremos “palavras inefáveis” (2Cor 12, 4), declaração de amor inefável que o Pai nos dirigirá, amando-nos como ama o seu Filho Jesus (cf. Jo 17,26). A Igreja acredita que os mártires e os santos desfrutam desta comunhão abençoada a partir de agora: “Bem-aventurados os mortos que morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, descansarão dos seus trabalhos, porque as suas obras os seguem” (Ap 14,13). “Reinam” com Cristo e são “sacerdotes”, isto é, intercedem pelos homens (cf. Ap 20,6).
Ver e amar a Deus far-nos-á extremamente felizes e, já que reinará o verdadeiro Amor que nos faz partilhar os sentimentos dos outros, haverá também plena reciprocidade e a capacidade de nos alegrarmos com a felicidade dos outros. Nesta maravilhosa “comunhão dos Santos” alegrar-nos-emos com a alegria uns dos outros e assim a felicidade partilhada crescerá infinitamente, multiplicar-se-á e expandir-se-á eternamente: será uma cascata ou avalanche de alegria!
4. O QUE ACONTECE QUANDO SE MORRE?
Para todos, imediatamente após a morte, haverá um Julgamento. Seremos julgados pelo nosso amor. Quem morre santamente vai para o Céu. Infelizmente, porém, muitos morrem sem estarem verdadeiramente prontos a entrar em Deus que é Amor infinito; e isto por vezes subitamente e depois de uma vida de pecado e de afastamento de Deus. No encontro com Deus, tudo o que fizemos por amor aparecerá e será recompensado, enquanto tudo o que fizemos de mal nos encherá de vergonha e dor (cf. 2 Cor 5,10).
5. O QUE É O “PURGATÓRIO”?
Tendo entrado na Eternidade, isto é, na Verdade de Deus, os defuntos que precisam de ser purificados poderão tomar consciência do mal que cometeram, arrepender-se dele e converter-se ao Senhor que “desceu aos infernos” para ser “Senhor dos vivos e dos mortos” (1Pd 2,19; Rm 14,9). Esta purificação, que ocorre “como que por fogo” (cf. 1Cor 3,15), é tradicionalmente designada por “purgatório”.
Talvez a melhor imagem do Purgatório seja a da incubadora: o estado em que os nascidos prematuramente são preparados para a vida. Os defuntos verão as suas vidas à luz de Deus, descobrindo os seus pecados e as suas consequências, mas também a misericórdia de Cristo e o valor dos méritos dos santos. Será uma reconciliação cheia de santa tristeza e de grande alegria.
6. PODEMOS INVOCAR OS SANTOS E REZAR PELOS MORTOS?
Sim. Os santos no Céu, e nós também, aqui na terra, podemos ajudar as almas dos defuntos que ainda não estão prontos para encontrar o Senhor, intercedendo por eles com orações. Mesmo nos tempos antigos, a oração e o sacrifício pelos mortos eram considerados “muito bons e nobres” e “sugeridos pelo pensamento da ressurreição” (2Mac 12,43s). Podemos invocar os santos (por exemplo, com as ladainhas ou com a Avé Maria) e rezar pelos defuntos (por exemplo, durante a Missa ou com oração “Dai-lhes, Senhor, o eterno descanso”). Deve ficar claro, porém, que não rezamos aos santos, muito menos aos mortos. A oração é sempre dirigida ao Deus único, o Pai celestial. Pedimos a Nossa Senhora e aos santos que “rezem por nós”; confiando-nos a eles como fazemos quando pedimos aos amigos cristianos que rezem por nós (cf. Cl 4,3).
7. O INFERNO É POSSÍVEL?
Sim. Essa possibilidade existe. Mas a Igreja acredita que o destino desejado e criado por Deus para os homens é o Paraíso, porque Ele «quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade» (1Tm 2,4). Em vez disso, o inferno é o endurecimento total no mal e a recusa absoluta da comunhão com Deus; é algo próprio do diabo e dos seus anjos (cf. Mt 25,41). A Igreja não declarou oficialmente que nenhum homem está condenado. Em vez disso, ela convida-nos a rezar e a ter esperança por todos. Devemos recordar que no momento do julgamento, o Deus justo, o juiz, que é eterno e prevê tudo, tomou, tem e terá em conta as nossas orações e a nossa intercessão pelos defuntos.
8. PODEMOS AJUDAR OS FALECIDOS?
Como único Sumo Sacerdote, Jesus Cristo obteve a salvação e fez de nós “um povo de sacerdotes” (1Pd 2,9). Unidos a Ele, também nós participamos na sua obra de intercessão e salvação do género humano (cf. Cl 1,24). Isto pode ser feito, com a sua graça, praticando as boas obras que Deus planeou que fizéssemos (cf. Ef 2,9-10). Entre estas obras destacam-se a oração, o jejum e a esmola (cf. Mt 6,1-18), que podemos praticar também em benefício dos defuntos; sobretudo a maior oração que é a Missa ou Eucaristia. Nela recordamos o sacrifício de amor de Jesus e rezamos também por todos os mortos. De acordo com uma antiga tradição, a Missa pode ser celebrada com uma intenção específica por uma pessoa falecida.
9. O QUE É A “RESSURREIÇÃO”?
Haverá um “fim do mundo” (2Pd 3,11ss), com um juízo que já não será apenas individual, mas universal (cf. Mt 25,31-46). Juntamente com este fim, terá lugar a ressurreição final (cf. Jo 5,28; Ap 20,13). Ressuscitaremos com o nosso corpo, com a nossa identidade visível e reconhecível, mas numa dimensão nova, imortal e espiritual (cf. 1Cor 15,42ss). Então, tudo o que seremos e tivermos feito será revelado a todos os homens e “ceifaremos” antes de tudo o que tivermos “semeado” na terra (cf. Gl 6,7s). Então também descobriremos tudo o que os outros fizeram por nós. Todo o sofrimento encontrará a sua consolação (cf. Ap 21,4), toda a boa acção, mesmo a mais escondida e secreta, será revelada e recompensada (cf. 1Cor 4,5). A ressurreição revelará o homem novo, o nosso “homem interior” (2Cor 4,16), irmão ou irmã de Jesus, que nasceu com o batismo, viveu respirando pela oração, nutrindo-se da Palavra de Deus e da Eucaristia e realizando
boas obras que permanecem para a vida eterna (cf. Rm 2,7; 1Jo 2,17).
Não só os homens, mas todo o Cosmos, o mundo inteiro, será transfigurado e glorificado por Deus que “será tudo em todos” (1Cor 15,28; cf. Rm 8,19ss; 2Pd 3,13).
10. A VIDA APÓS A MORTE É DEUS QUE É AMOR
Deus é Amor, e Ele quer que vivamos aqui na Terra em amor verdadeiro e livre e que então estejamos eternamente com Ele e com os outros em perfeita comunhão e felicidade (= Céu).
Aqueles que na Terra apenas parcialmente se ‘habituaram’ ao amor poderão ser purificados, também graças à nossa ajuda, após a sua morte (= Purgatório).
Aqueles que, por outro lado, se recusam totalmente a amar, condenam-se a permanecer para sempre em total solidão (= Inferno).
A esperança da vida após a morte enche-nos de alegria e encoraja-nos a viver esta vida terrena em pleno e com intensidade: “a expectativa de uma nova terra não deve enfraquecer, mas antes estimular a nossa solicitude pela obra desta terra” (Concílio Vaticano II, Gaudium et spes, 39).
